Thais Barros e Gilson Schwartz (*)

Alunos do século 21. Professores do século 20. Escolas do século 19… Eis a fórmula que para muitos resume o desafio de mudar a escola para uma época de “tablets”, celulares, sensores e redes sociais. A tecnologia não inventou o descompasso entre alunos, professores e instituições educacionais, mas sem dúvida torna essa incongruência ainda mais dramática na sociedade do conhecimento.

Nesse contexto, é preciso ampliar o debate em torno dos resultados divulgados pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC.br), que acaba de divulgar a pesquisa “TIC Crianças 2010”. Foram realizadas mais de duas mil entrevistas com crianças entre 5 e 9 anos de idade, em áreas urbanas e rurais, entre setembro e novembro de 2010.

Os dados apontam que 27% dos domicílios brasileiros tem acesso à Internet (CGI.br, 2010), sendo apenas 6% na área rural. Apesar desta limitação, é interessante observar que 51% das crianças entrevistadas relatam ter utilizado computador e 27% afirmam já ter utilizado a Internet.
Jogar e realizar atividades escolares (sobretudo busca) são as atividades que se destacam. Mas os jogos são citados por 90% das crianças! Nenhuma novidade, ainda que o tema dos games mal tenha começado a entrar em nossas agendas de pesquisa, em especial na área pedagógica. Redes sociais também têm um apelo significativo: 29% das crianças entrevistadas já usaram Orkut e Facebook, entre outros softwares de relacionamento.
Quanto à aquisição das habilidades para usar as TICs, os professores ainda teem papel fundamental: são apontados por 37% das crianças da pesquisa, número que sobe para 53% na área rural. Dentre as crianças entrevistadas, 60% usam o celular, aqui também com destaque para os jogos (84%). Questões voltadas à segurança e participação da família também estão presentes no levantamento.
A cultura digital promove novas demandas e instaura dinâmicas que desafiam autoridades, controles e medidas de desempenho pessoal, social, educacional e profissional. Essa realidade traz desafios e oportunidades para os professores caso pretendam cerrar fileiras com seus alunos em defesa de práticas pedagógicas inspiradoras, capazes de ir além da mera transmissão de informações.

Entre os jovens entrevistados, é grande a expectativa de encontrar um professor mais próximo, mais “amigo”, disposto a compartilhar (mais qaue “transmitir”) conhecimento de maneira lúdica e colaborativa. As novas tecnologias podem ajudar, mas também podem aprofundar os conflitos inevitáveis numa época de grande mudança tecnológica.

Na rede pública o uso de celular é vetado. Muitos professores veem no brincar uma ameaça à autoridade e entendem os games como dispositivos violentos e alienantes.
O estudo do Cetic.br ao menos sugere que a linguagem das novas gerações já é enriquecida por outras formas de apropriação cujos resultados educacionais e culturais ainda são uma importante incógnita do processo.
Vemos nesse horizonte um campo inovador para a pesquisa e também para o debate de propostas e ações que nos permitam alcançar maior e melhor alinhamento entre professores, alunos e instituições. A apropriação dos novos recursos tecnológicos em favor de práticas de aprendizagem mais criativas e singulares é o desafio que nos levará ao século 22.
A pesquisa “TIC Criança” está disponível em http://www.cetic.br/usuarios/criancas/2010/apresentacao-tic-criancas-2010.pdf

(*) Thais Barros é Mestre pelo Programa de Pós Graduação em Meios e Processos Audiovisuais da USP, sob orientação de Gilson Schwartz, líder do grupo de pesquisa Cidade do Conhecimento, professor do Departamento de Cinema, Rádio e TV da Escola de Comunicações e Artes da USP e diretor para América Latina da rede internacional “Games for Change” (HTTP://www.gamesforchange.org.br).